domingo, 19 de fevereiro de 2017

Me Fala Sobre Você



"Olá. Como vai você? O que tem feito da vida? O trabalho está corrido? Me conta sua cor preferida. Conta qual hora do dia você prefere, e porque. Me diz qual o seu signo. Sua idade. E o que mais quiser me contar. Me pergunta também o que você quiser saber sobre mim - e eu te juro que vou responder com a maior sinceridade do mundo.

Nesse mundo de meu Deus, ninguém mais quer saber de conversas, conversas de verdade, que vão além de "oi-tudo bem? vamos sair no final de semana-te pego as 18". Uma ficada e até nunca mais. Uma taça de vinho e o copo fica cheio de digitais - de uma, de dias, de muitas mulheres. E por que não? De homens também.
Ninguém mais quer saber de ligações que vão além da tela do celular, de contatos que vão além de uma noite, de algo que ultrapasse umas semanas. Qual é, ela está se apegando, vou dar o fora. Nossa, ele está me levando a sério, não quero mais.

Às vezes eu me pergunto se o mundo está de ponta-cabeça, ou se ele está certo, e quem está de ponta cabeça sou eu. Eu quero algo além de uma semana contada - e sim alguém que me faça perder a noção do tempo, com quem um mês pareça uma semana e ao mesmo tempo um ano. Alguém que tire meus pés do chão pra não me derrubar lá do alto depois. Alguém que queira conversar - conversar de verdade - e não um "oi tudo bem-quero ficar com você-tchau"
Alguém que trate pessoas como pessoas e não como números.
Mas é cada vez mais raro esse tipo de pessoa - e às vezes me sinto sozinha ao ver que mais da metade do mundo não quer saber de contatos que vão além do físico - aqueles que mexem na alma.

Mas mesmo assim, eu não desisto da ideia de te conhecer - de conhecer você de verdade e descobrir o que gosta, o que não gosta, quais seus sonhos e aspirações. E se você não quiser saber os meus de volta, eu vou conviver com isso - como vivi com tantos que passaram e deixaram suas impressões em mim e sequer levaram lembranças minhas - porque as pessoas são assim.
Mas por que não eu, eu não sei, é nunca vou saber.

Ainda assim, quero saber.

"Como vai você? O que você enxerga quando fecha os olhos? Qual cor tem os seus sonhos. Qual hora do dia você prefere, e por que?"

Nathália Zarpellon



Aos Vinte E Poucos



"Acordo de mais uma noite ruim - aquelas em que eu tenho pesadelos, acordo com eles frescos na cabeça, e eles vão se tornando menos nítidos à medida que acordo, até só sobrar uma sensação ruim e o esboço de uma lembrança. A vontade é de passar o dia na cama, mas a vida não para e espera até que você esteja pronta para viver.
Desbloqueio o celular, e olho as conversas do whatsapp sem me demorar em nenhuma. Esfrego os olhos, levanto e me arrasto até a cozinha. Passo um café, daquele que acorda até a alma, e me preparo para mais um dia de trabalho, estudo, e nenhuma diversão. Dizem que a essa idade a gente tem mais energia e disposição, mas eu não encontro nenhum dos dois em grande quantia.

Aos vinte e poucos, nem sempre a gente sabe o que quer fazer da vida, mas a sociedade cobra uma resposta: uma faculdade, um trabalho. E você escolhe um curso que talvez não seja o que você queria - porque o seu irmão mais novo que você já está na faculdade. E você arruma dois empregos quando mal da conta de um, porque precisa pagar a mensalidade, a conta de luz, é muito importante: a internet. Porque a geração dos vinte depende da internet.
Você convive com pessoas de todo o tipo: pessoas incríveis, pessoas medíocres, pessoas que te fazem querer esfregar a cara delas no asfalto, e precisa suportar todas. Sua mãe te dizia pra falar sempre a verdade, mas aos vinte e poucos você descobre que pessoas que falam muito a verdade ficam mais sozinhas, porque as pessoas não querem ouvir a verdade, elas querem ouvir o que é conveniente.
E você faz um amigo aqui, um amigo ali. Uma amizade que te puxa o tapete e te derruba - mas você tem que se levante e andar como se nada tivesse acontecido.
-Porque a vida não para, porque você precisa aprender a separar as coisas.

E você quer correr pro colo da sua mãe - mas ela está a quilômetros de distância, ou pior, a uma distância que existe mesmo com a proximidade do mesmo lar. E você não tem um namorado, mas é cobrada o tempo todo por ter um namorado - porque a sua prima 3 anos mais nova que você já está quase casando. E você consegue um namorado porque te fazem acreditar que você precisa, mas o vazio, continua.
Os problemas vem e vão, e mesmo quando você não sabe o que fazer, você precisa saber, porque ninguém vai resolver por você. 

Aos vinte e poucos você descobre que você pode ter amigos, mas você precisa se virar sozinho.
Trabalho, estudo, amizades falsas. Compras pra casa, contas a pagar, se tornar expert em tempo-horário de ônibus. Somado a isso, você aprende que coração partido não te dá um dia de folga na empresa - e as pessoas vão partir seu coração e você vai ter que seguir como se nada tivesse acontecido. Porque nessa geração não temos tempo pra passar um dia quietos no calor de nosso lar, chorando baixinho e olhando a chuva que bate na janela. Sendo realista, não temos tempo pra passar duas horas sem fazer nada, e ouvindo o silêncio que o nosso coração faz.

Levanta a cabeça, princesa. Caiu? Levanta. Apanhou? Se prepara, a vida te bate mais forte. Quebrou o coração? Cola com super bonder e vai estudar. Vai trabalhar. Para de chorar porque a sua melhor amiga te decepcionou. Seja adulta. Sua prima mais nova que você já está formada.

Aos vinte e poucos, nós precisamos ser adultos antes de ser. Precisamos parar de pedir o colo da mãe, de chorar porque quebrou o dente, ralou o joelho - ou o coração - e conciliar trabalho, com estudo, vida amorosa, pessoal. Diversão? Se sobrar tempo. Parou de estudar por que?
Não é à toa que muitas pessoas são diagnosticadas com depressão, transtorno de ansiedade, bipolaridade, ou chegam a cometer suicidio. A sociedade de hoje exige muito do jovem, quando devia se lembrar que ele está treinando para ser adulto. Não estamos prontos, não ainda, mas precisamos aprender na prática - errando errando e errando.

Mas o que eu estou fazendo escrevendo esse texto? Poderia estar usando esse tempo para estudar, mandar currículos, me inscrever em mais um curso, ou um concurso. Porque é com vinte e poucos que eu vou decidir o que eu quero pra vida - é isso é uma baita de uma responsabilidade. Estão preparados?"


Nathália Zarpellon