quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

Ao Cara Errado


"Você disse que queria ir embora, mas que eu estava te prendendo. Disse que não via a hora de sair por aquela porta, e que eu não deixava que você partisse. Disse que meu hálito pela manhã o incomodava, e que você se irritava ao ver minhas meias espalhadas pelo chão – ainda que soubesse que eu as tirava quando chegava em casa cansada demais para coloca-las no cesto. Olha, você sabe que eu nunca gostei de dormir de meias. Mas isso não vem ao caso.
Você reclamou do meu vício em colecionar ímãs de geladeira, e dizia que eu parecia uma criança mimada, em vez de uma mulher crescida. Quando entrava em minha casa, era como se reparasse em toda aquela bagunça – menos em mim. E eu gritava, por entre uma roupa caída e um copo sujo – “olha eu aqui”. Mas você parecia não enxergar todo o carinho que eu estava ansiosa para te dar, e sempre perdia a paciência quando eu tentava ser irônica, e você estava estressado por mais um dia de trabalho.

É claro que não foi sempre assim. Houve uma época em que você sorria ao me chamar de bagunceira, e juntávamos os copos espalhados pela casa – e um lavava, o outro guardava. Sem enxugar. Eu sempre esperei a louça secar sozinha. Algo em que você nunca viu problemas. Ou parecia não ver...

Todos os relacionamentos estão fadados a esse final? Perder o encanto, e só sobrarem mau humor e ameaças de abandono? Acredito que não. E acredito que, se você vê mais defeitos do que qualidade em mim, é porque deixou de me amar.

Claro que às vezes nós mudamos, e as pessoas amavam o que éramos, e não o que passamos a ser. Mas nós dois sabemos que não era o caso. Eu sempre fui a mesma menina mimada, bagunceira e cheia de manias desde o dia em que nos encontramos naquele pub que nenhum de nós dois frequentávamos, mas nossos amigos conseguiram nos levar.
Porém, você parece se incomodar com pequenas coisas que antes te eram naturais. Além, é claro, das duras palavras que você diz quando afirma que quer ir embora – e demonstra que minha presença te incomoda.

Portanto, acho que é hora de “te deixar ir” – já que você diz que não vai só porque eu não deixo. E é hora de me permitir ir também.

Pode ir, e não se incomode em lavar o copo que sujar quando se servir de um pouco de coca cola ao entrar aqui – eu nunca fui a única cheia de manias. Pode ir, e não se preocupe em levar sua escova de dentes – eu já a joguei fora mesmo. Pode ir, e não se importe ao trancar o protão, mesmo que eu esqueça de trancá-lo depois.
Pode ir, já que era o que tanto queria, e queria de tal forma, que eu passei a querer também.

Afinal, se você queria tanto ir embora, é porque nunca foi o cara certo. E com caras errados, eu não preciso perder nada – nem meu tempo, nem meu carinho, nem o meu esforço. Porque quem ama, aceita a pessoa com todos os seus defeitos, ou melhor, com o seu jeito.
Porque defeitos, quem via era você. Eu vejo uma personalidade. E com certeza o cara certo, vai enxergar também.

E de mim? Fique sabendo que eu vou ficar bem. Eu nunca precisei de você, embora você parecesse acreditar nisso ao dizer que eu te impedia de ir embora. Eu queria estar de você, o que é muito diferente. Mas eu deixei de querer.
E se um dia desejar estar comigo de novo, lembre-se de suas próprias palavras, e conforte-se ao saber que você conseguiu o que eu queria. E não importa quanto tempo tenha passado – uma semana, um mês ou 60 dias – saiba que eu também estou conseguindo o que eu queria.

Mas acho que você nunca se importou em saber o que era, não é mesmo?"


Nathália Zarpellon




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